Seguro a garrafa de vinho branco molhada e gelada, e encosto à cara. Sinto o inchaço a diminuir, mas vai voltar se retirar a garrafa.
O toque suave da garrafa lisa e fria dá-me uma boa sensação. A dor no dente passa lentamente.
Os dias andam cinzentos. Apesar de até ter voltado à guitarra e de ter deixado crescer as unhas para tocar melhor, isso não me tem garantido dias de verão e brisas ligeiras. As pessoas desiludem-me continuamente, sobretudo as desconhecidas. De alguma forma isso tem-me afectado... os deconhecidos.
Se controlo a minha vida, então porque deixo aos desconhecidos o poder de me desiludirem? Que ilusão podem os desconhecidos ter-me criado, sendo desconhecidos? Pode ser a ilusão de que um desconhecido pode sempre aparecer e resolver-me os problemas todos. Um terrorista por exemplo. Até porque este ano têm caído como tordos grandes figuras de todas as áreas. Será que vou ter que reconhecer que não sou (nem serei nunca) uma grande figura seja de que área for? Nãooooo!!!!! Isso não é possível. :)
Vou matutar no assunto e depois logo vejo. Deixa lá por novamente a garrafa gelada na cara.
James - Sit Down (2001 final live performance )
Confesso que amei. Amei e tenho amado sem moderação nem reservas, sem temor nem calculismo. Amei porque sim.
Tive essa sorte de amar, de me apaixonar de me entregar sempre e mais uma vez. Apesar das quedas, dos desastres, dos estampanços de frente, continuei com uma quase candura a querer amar como da primeira vez. Em cada amor acabado deixei uma parte de mim, pelo que agora sinto-me um pouco por todo o lado. Partes que somadas não fazem um todo. Um braço aqui, um pé ali e no entanto sinto-me inteiro. Um pouco mais nostáligico do que podia ter sido, deste ou daquele futuro que se esboroou com o fechar da cortina.
O meu porto seguro são essas nódoas negras, são a única coisa que tenho garantida.
A questão é mesmo não desistir, porque olho à volta e vejo tantos braços caídos, tantas pessoas sentadas no lancil do passeio acarinhando as suas feridas e nódoas negras.
Sinto sempre a esperança de levantar voo e sentir-me mais, melhor que eu, capaz de tudo o que não sou.
HMB ft. Carminho - O Amor é Assim
Estou a ver as nuvens escuras ao fundo, mas não me vão apanhar.
Uma espécie de som de bezouro no ouvido desperta-me do turpor que se apoderou de mim. Demasiado tempo à espera...
"Buenas tardes, como le puedo ayudar!?"
Não podia. A parvoíce e necessidade de atenção não se corrigem por telefone.
Podia sim soltar a amarra e partir içando as velas ao som da imaginação. Ondas batidas a vento no casco, quase sinto os salpicos na face, o frio de gelar até aos ossos, apesar de ser Outono e a temperatura quase Verão.
Também podia sair do trabalho, pôr o capacete, sentar na Vespa e arrancar por aí. Parar numa tasca e falar com este ou aquele. Falar das vindimas, do calor artificial que faz, da falta de homens para trabalhar, de como se fazem estes pasteis tão bons, que quase nem se sente que foram fritos. Da Dona Mísia que cozinha como ninguém e do seu orgulhoso marido, do filho que levanta os olhos do telemóvel desabituado de que alguém fale com os pais sem ser para pedir isto ou aquilo. Dos produtos difíceis de comprar por não terem qualidade e os dos supermercados "Deus me livre". Dos turistas que descobrem tudo, como é que sabem lá na Finlandia que existe aqui um restaurante!? Mas sabem! E gostam e não querem saber da ASAE nem da factura, nem da conta escrita num papel do tamanho de um cartão de crédito, com números desenhados com cuidado e sem jeito e a soma arredondada.
Gosto do meu povo.
Ana Moura - Desfado
Levanto-me ensonado com o despertador do telefone a arranhar-me o cérebro. Desligo-o um dia mais num gesto impensado. O cérebro empastelado abre uma gaveta e conjuga peças de vestuário, nem sei como funciona bem no fim, mas funciona.
The Beatles - Help
Barba, duche, roupa, pequeno almoço, café, metro, livro... almoço, fruta ... café, empada, metro, livro, padaria, mercearia, casa.
Finalmente começa o dia! O que há hoje por aí!?!?!?
Amigos, bares, música, exposições, conversas, jantar... as respostas nos outros. Mesmo que o não saibam, são eles que as têm.
Uma boa conversa compensa a inutilidade do dia de trabalho.
É só trabalho...
O mundo mudou. A liberdade que antes sentíamos já não existe. Os limites que antes sentíamos também mudaram de sítio.
E esta sensação de ter vivido alguns momentos únicos como se fossem eternos, como se fossem estar lá sempre. Como se o Live Aid fosse acontecer todos os anos, como se a queda do muro de Berlin fosse natural, e a seguir a ela o fim do apartheid e o caminho fosse sempre no mesmo sentido. O caminho da justiça e da compreensão e tolerância.
Olho para trás e esta é a única coisa de que me arrependo. Não ter tido a noção de que eram momentos únicos e que tinham de ser vividos e compreendidos na sua totalidade.
De onde surgiram estas pessoas com trajes adaptados aos desertos, que enchem as cidades ocidentais que não construíram nem entendem? De onde lhes vem a legitimidade que seguramente sentem para destruir o que não entendem?
Há um qualquer factor de humanidade que nos esquecemos de lhes preencher. Algo que lhes faça sentir o propósito da sua existência e retire o sentido ao gesto de se fazer explodir.
Destruir não é um bom objectivo de vida, mesmo que seja a própria vida.
U2 - Where the streets have no name
A net está cheia de coisas destas. Blogs moribundos que alguém abandonou por aí. Confesso que já nem sabia entrar aqui e publicar qualquer coisa, por isso publico esta canção:
Tiago Bettencourt - Eu esperei
Eu esperei
Mas o dia não se fez melhor
Mas o sujo não se quis limpar,
Inventou mais flores em meu redor
Como se eu não fosse olhar!
Enfeitou as ruas para cobrir
Terra seca de não semear
Deram-me água turva de beber
Dizem cura e força e solução
Como se eu não fosse olhar!
Eu esperei
Mas o fumo não saiu da estrada
Arde o sonho em troca de nada
Dizem festa, mas é solidão
Como se eu não fosse olhar!
A mentira não se fez verdade
E a justiça não se fez mulher
A revolta não se fez vontade
Braços novos sem educação
Sangue velho chora de saudade!
Eu esperei
Dizem luta mas não há destino
Dão-me luzes mas não é caminho
Dizem corre mas não é batalha
Como quem não quer mudar!
Esta corda não nos sai das mãos
Esta lama não nos sai do chão
Esta venda não deixa alcançar.
Cantam "armas" mas não é amor
Mão no peito mas não é amar
Fato justo mas sem lealdade
Cavaleiro mas já sem moral
Braços sujos que se vão esconder
Braços fracos não são de lutar
Braços baixos não se querem ver
Como se eu não fosse olhar!
Eu esperei
Pelo tempo transparente em nós
Pelo fruto puro de escolher
Pela força feita de alegria
Mas o povo dorme na ilusão!
E a tristeza é forma de sinal
Liberdade pode ser prisão...
Meu deus, livra-nos do mal
E acorda portugal...
Elevação:
1. Acto de elevar; ascensão. 2. Distância desde o solo, ou a partir de um ponto dado; altura. 3. Lugar que fica sobranceiro; eminência; outeiro, colina. 4. Aumento. 5. Exaltação a uma dignidade. 6. Grandeza, nobreza; distinção.
Tiago Bettencourt - Aquilo que eu não fiz
E é o ponto 6 que me interessa particularmente. "Grandeza, nobreza; distinção". Falta-nos elevação, seja em que debate for... neste caso interessa-me o debate político.
Não custa reconhecer que errámos. Custa no entanto, constatar que há líderes agarrados ao poder sem o mínimo pudor.
Sem saídas profissionais, Seguro agarra-se aos estatutos de forma mesquinha e até imoral. Não nos devemos esquecer que alterou os estatutos a gosto e definiu uma forma estatutária de se prepetuar no poder.
Onde está a nobreza de um fulano que se agarra às leis... como se não fossem feitas por homens. Necessariamente imperfeitos, necessariamente atrasados.
O caminho não é esse. Se Seguro olhar para dentro, vai entender...
Recordo-me ocasionalmente da tua ausência, do teu espaço dentro de mim, hoje tão reduzido quando comparado com a galáxia de possibilidades que me oferecias. Recordo-me com um misto de saudade e consciência de que a nossa natureza humana vence sempre, que o espaço que ocupaste hoje parece um deserto frio de areia e rocha onde antes florescia uma paisagem verdejante paradisíaca.
Magoa-me a minha inconsciência de que tudo aquilo poderia nunca mais ter igual, poderia ser único. Que burro! Como pude achar que aquelas emoções eram minhas quando na realidade só as emprestaste? Vivi tudo como se pudesse durar para sempre... éramos deuses sem o saber.
The XX - Intro
Hoje olho para dentro, para o deserto, e não consigo imaginar que torrente de água e verde alguma vez conseguirá devolver sequer vida à desolação evidente. Hoje ignoro alguns avanços porque todos me parecem torpes, hoje sei que todo esse espaço é teu, ainda que já lá não estejas. Hoje todo esse espaço me parece inútil embora não o dispense, pois lembra-me que já o vivi. Ocasionalmente alguém o atravessa e espanta-se tentando imaginar a dimensão de tal amor, como uma criança de braços abertos explica o tamanho do mar e com os seus pequenos braços o pensa abraçar.
Salgaste o terreno hoje abandonado, sabendo que nem tu nem ninguém o voltaria a usar. Tu porque não te reconheço, não és a mesma de outrora, deixaste a vontade lá atrás algures naqueles dias e já não contas com a minha ajuda. Mais ninguém porque acabo por não o permitir, sem vontade nem vigor, porque nenhuma construção vale a pena se não ambiciona sequer 1% do que lá vivemos.
Partiste é certo, mas o que deixaste para trás, ainda que vazio, ainda lá está.
Como a chuva de verão, um sol de inverno, sinto-me uma espécie de sobrevivente, contra tudo e contra todos.
Mas não é verdade. Família e amigos são um apoio indispensável seja para quem for e eu não sou excepção. Ainda bem porque os tenho muitos e bons.
Os acontecimentos sucedem-se a um ritmo absurdo.
O mundo adoeceu. O dinheiro e a fama elevados a valor, no altar do "desenvolvimento" e da "modernidade". Sinto que não passamos de parolos quando esquecemos as coisas simples, quando desleixamos as emoções básicas.
Perdemos a capacidade empática para com o outro. Talvez demasiados programas de "Apanhados" na TV nos estejam a deixar a pele mais grossa, as emoções mais rijas. Os Coelhos desta vida, indiferentes ao sofrimento alheio, inconscientes das suas próprias limitações e mediocridade. Os Portas carregados de estratégias de silêncios bem geridos, de enriquecimento e ganância. Ambos incapazes de fazer o que está certo e depôr os milhares, as dezenas ou centenas de milhar de pessoas nomeadas para o aparelho de estado durante 4 décadas e que não são necessárias. Que se entretêm uns aos outros sem propósito.
Não, a solução não está em ter políticos profissionais, nem deputados profissionais, sem conhecerem a vida real. Enchem a boca a falar de eficiência e de rentabilidade dos portugueses e não tratam de fazer um exercício de auto-crítica. Quanta da ineficiência é causada por legislação desconexa, produção de leis sobre leis, alterações constantes sem rumo? Se os centros de decisão já não estão em Portugal, então quem elege os decisores? Quem elege os Barrosos, os Shultzs, os Junqueres desta europa?
Acredito muito nesta frase de Gandhi: "Começa em ti a mudança que queres ver no mundo".
Vamos ser todos melhores pessoas, melhores profissionais e tudo vai melhorar.
Aretha Franklin - Think
Abro o envelope com o coração, só sinto o coração. Nem as mãos sentem o envelope, nem os dedos o papel. Começo a ler e não consigo entender... mas isso foi explicado... mas como é que... a decisão... a decisão é devastadora e impossível de cumprir.
Levanto-me. Sim, tinha-me sentado. Tenho que sentir as pernas, outra coisa além do coração. Tomo consciência como é que as notícias do Correio da Manhã acontecem. Decisões injustas levam a actos tresloucados e só me apetece cometer um qualquer. Claro que não vou fazer nada, mas...
Já não me recordo quando é que deixei a minha vida ser arrastada para a justiça. Quando é que dei aos outros espaço para me imporem decisões à martelada.
Este é realmente o martelo da justiça portuguesa. A vida suspença anos a fio para ver imposta uma injustiça visível na própria sentença, na lógica parcial da argumentação.
Tem que ter havido um dia, uma situação, em que fiz uma escolha errada. Esse dia tornou o resto inevitável. O instante imediatamente anterior à avalanche. Aquela que arrasa tudo à sua passagem. No final, se depois aquele castanheiro ficou de pé ou se foi aquele pinheiro, pouco importa. O que importa é a devastação e ela é inegável.
Um deserto.
Um deserto gelado de branco frio a perder de vista.
Nem um ser vivo, uma planta, nada.
Uma imensidão de branco estéril
É como me sinto.
Sem dignidade nem ser
Nem nada.
Agarrado por mentiras
que me cercam como uma teia
Apanhado pela aranha
caio e tropeço até deixar de sentir.
Já não me sinto.
Ornatos Violeta - Capitão Romance
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