Sexta-feira, 8 de Março de 2013

A manifestação

Cheguei ao Marquês de Pombal à hora marcada. As meia dúzia de pessoas presentes desanimariam qualquer um. Ao fim de vinte minutos fui até ao cimo da avenida da Liberdade e o sentimento mudou. A avenida estava completamente cheia até onde a vista alcançava. Calma e sem grandes alaridos, uma quantidade impressionante de pessoas manifestou-se.

 

2 de março de 2013

 

Percebia-se que quem lá esteve, esteve como eu. Sem experiência em manifestações, só com o desejo de fazer uma declaração. A de que quem votou neste governo, não votou nisto (e eu nem sequer votei neles). A de que quem falha previsões em 100%, não merece crédito. Sim! Quem prevê uma recessão de 1% e acaba a verificar que ela é de 1,9%, é como um mecânico que afirma que a reparação fica em 500€ e no final pede 1000€. A um mecânico assim chamamos aldrabão, a um ministro chamamos o quê?

Não se vislumbra no horizonte uma única medida que revele solideriedade dos políticos eleitos com os sacrifícios da população que os elegeu. O grupo parlamentar do PS troca de carros e compra Audi A5 em vez de BMW série 5, como se isso fosse relevante, não se observam quaisquer medidas de emergência como se a sociedade não estivesse em sofrimento. Os empresários da restauração suicidam-se, os desempregados aumentam todos os dias, os sem abrigo vêem-se por todos os lados e cada vez mais.

 

No meio disto tudo, ontem vejo um António Borges defender a privatização da TAP por alegadas "interferências políticas na sua gestão". Não querendo ficar atrás, Passos Coelho fingiu que a manifestação não trouxe 1 milhão de pessoas para a rua, colocou a cabeça na areia e pressistiu (verbo que muito lhe agrada) teimoso, em governar contra os portugueses. Tornando miseráveis os seus concidadãos. Onde espera chegar com esta atitude? Desconheço. Assim como desconheço quem queira votar nele... talvez lhe baste como futuro um lugar de administrador num banco. Para um primeiro ministro mediocre, ambições mediocres.

 

 

Patxi Andion - Me esta doliendo una pena



publicado por BigJoao às 22:37
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Terça-feira, 1 de Janeiro de 2013

Aquela pequena dor

Adotei o novo acordo ortográfico. Espero conseguir adaptar-me ao que me proponho, em nome da standardização pretendida.

 

Acordei sem me levantar. A falta de vontade é gigantesca, pareço uma grua gripada.

A cabeça sempre a pensar... será que não se consegue parar de pensar? Esvaziar a cabeça?

Sinto-me desfocado. Uma fotografia tirada à noite, quase sem luz, cheia de grão, desfocada e tremida.

 

(foto de Aníbal Novo)

 

Percorro as ruas de Lisboa, sem as ver. Os caminhos quase de cór, sem os sentir.

As ruas sem a agitação de outros Natais, agonizam exangues, pobres, lentas.

 

Também não sinto o Porto, nem as suas calçadas cinzentas de cimento entregues às gaivotas, companheiras de sempre. Para elas não há crise, nem governos, não há troikas, nem empréstimos.

 

Não me sinto por milhões de pequeninos motivos. Por milhões de pequeninas dores.

 

Rui Veloso - Pequena Dor

 

A reação tarda em chegar. De repente faz-se o clique, mas até lá é preciso esperar. Não vejo como nem porquê, mas esperar parece ser a melhor opção.

Onde está o projeto que me vai fazer levantar cheio de vontade de fazer coisas? Estou à espera desse clique.

A vertígem de estar tudo em aberto pode ser aterradora. O mundo está aí ao meu dispôr. É só apontar numa direção.


publicado por BigJoao às 12:52
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Quinta-feira, 6 de Dezembro de 2012

O sucesso

As relações, os afectos, os filhos, a família, os amigos, os colegas, os cursos, as certificações, o trabalho, os bens ... qual é a medida do sucesso? Qual é a medida do falhanço?

 

É difícil sentir-me bem em mim. Por vezes preciso do silêncio, preciso de estar comigo. Saí de casa com a chuva a cair. Protejo o livro dentro do casaco, não gosto de ver livros com páginas molhadas de chuva. Não vou ler, quero simplesmente a sua companhia. Aquele cantinho acolhedor resguardado dentro do casaco.

 

 

Respiro. Inspiro aquele ar frio... expiro-o já processado. Nada de especial, sempre o fiz. Sempre não! Houve aquele dia em que te estava a chatear de propósito irmã. Era grande mas imaturo, como todos os rapazes de 15 anos a chatear as irmãs são. Já não me conseguias bater sem que o deixasse. Deste-me um murro nas costas e de repente parei de respirar. Incrédulo quis inspirar e não consegui, uma, duas, três tentativas e nada... já deitado no chão lá comecei a conseguir. Não foram mais de 20 segundos mas foi assustador.

Hoje olho para trás e sei que fiz o que tinha que fazer. Melhor ou pior, fiz. Não me devia sentir derrotado, sem vontade. Nem eu nem os outros 16,9% de desempregados.

 

Hands on Approach - Days of Our Own


publicado por BigJoao às 00:18
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Quinta-feira, 20 de Setembro de 2012

Linhas

A caneta desenha letras no papel, criando um estranho quadro, uma estranha imagem de linhas separadas a espaços... por espaços. O papel, outrora de uma candura tipificada, normalizada e monótona vai-se deixando manchar sem retorno. Também a vida não tem volta.

 

 

As palavras foram ditas sem retorno. Palavras de fuga, palavras de enganar, palavras de indecisão. Qualquer palavra era boa para evitar a perda. Qualquer ardil era bom para atingir aquele fim.

 

As pessoas revelam-se em três tempos, basta enfrentarem uma crise, uma situação extrema e lá estão elas a espreitar, os seus princípios, a sua estrutura, os seus valores.

 

Fingiu um desequilíbrio instantâneo e avançou vacilante pelo corredor. O tecto baixo misturado com as lâmpadas flurescentes projectam sombras em todas as direcções. Ruídos estranhos e ligeiros, numa quietude de vigília. Uma calma tensa.

As paredes brancas cheias de placards informativos, "Saída", "Recepção". Pessoas paradas pelos cantos.

 

A decisão surgiu, sempre demorada. Sempre a mesma espera... as regras... os procedimentos... as vontades... a dor.

O homem sempre quis brincar aos deuses, deformar sonhos, encontrar a insustentável leveza do ser. Soa sempre a piada de mau gosto.

 

Bob Dylan - Jokerman


publicado por BigJoao às 02:05
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Sexta-feira, 11 de Maio de 2012

Somos nós

As mãos dormentes... o torpor do álcool. De repente os sons soam melhor, mais límpidos. Será possível que já bebi meia garrafa? Bom vinho este. Santa Marta de Penaguião é uma bonita zona, feita de anos de trabalho, anos de vidas vividas para cada socalco. A esperança a cada colheita, a esperança de colher as uvas de um futuro vinho memorável... daqueles que só vão ser bebidos daqui a 40... 50 anos!

 

Pedro Abrunhosa - Se eu fosse um dia o teu olhar

 

Ao fim do dia de vindima, a taberna. A conversa com os homens de mãos ásperas, calejadas da tesoura de apanhar as uvas e segurar em "Mines", ou em copos de tinto. A conversa sem nenhum rumo, fala-se das propriedades, da qualidade da uva, do tempo que fez este ano, do que tem o patrão A e o B... deita-se conversa fora. De manhã, a esperança que da vindima apareça um vinho extraordinário, a esperança de ter contribuído e participado nessa criação. A esperança que os "estrangeiros" premeiem aquele vinho, aquela criação...

Um dia a seguir ao outro. Uma tia que morre, um primo que sofre um acidente, uma festa das vindimas, um baptizado, um tio que volta de França, um primo que deixa os estudo e vai pastar ovelhas.

 

Portugal também é isto... não é só viver em Gondomar ou no Cacém... também é isto.


publicado por BigJoao às 00:39
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Domingo, 29 de Abril de 2012

Já não fumo

Levanto-me da cadeira e vou à janela. Lá fora chove e a iluminação de rua empresta um tom surreal à imagem, enriquecida pelo som monótono de milhares de pingos a caírem no chão, nos carros, nas árvores, na roupa. Sinto frio, mas fico mais um pouco. Ninguém na rua.

 

Chuva

 

Se fumasse acenderia agora o cigarro e deixaria de sentir a dor, deixaria que o fumo ocupasse o vazio. Podía encher a cabeça de música de batida previsível, sem riqueza instrumental nem rasgos de génio ou não. Talvez numa qualquer danceteria, com um qualquer grupo de amigos mais ou menos perfeitos desconhecidos, mas isso nunca me preencheu. Podia bater com a cabeça na parede, amolgar a tinta, amolgar-me por dentro. Retirar a forma, atribuíndo-lhe novos tons, novas claves de sol ou de dó, dó de mim próprio. Que patético... auto-comiseração... será que agora deu-me para isso? Como cheguei aqui?

 

Volto para a cozinha, pego no grão demolhado e deito na panela de pressão, junto água e ponho ao lume. Olho o relógio e calculo a hora a que estará pronto. Tarefas rotineiras que me trazem de volta. A vida chama, puxa por mim, por todos. O mundo não espera que eu resolva nenhum problema. Porque haveria de esperar?

Assumo as minhas responsabilidades, todos temos que o fazer.

 

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publicado por BigJoao às 00:04
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Sexta-feira, 6 de Abril de 2012

O torpor

Fui procurar o significado da palavra crise e achei interessante o que encontrei.

 

Crise - "estado de um doente que se deve à luta entre o agente agressor infecioso e as forças de defesa do organismo.

Manifestação violenta, repentina e breve de um sentimento, entusiasmo ou afeto; acesso: crise de gargalhadas; crise de arrependimento.

Fig. Momento perigoso ou difícil de uma evolução ou de um processo; período de desordem acompanhado de busca penosa de uma solução: a adolescência é uma crise necessária."

 

Estamos em crise, somos portanto doentes em busca penosa de uma solução. Podemos procurar a solução sozinhos ou em grupo, sabendo à priori que, sozinhos é muito mais difícil e talvez nem todos a vamos conseguir encontrar. Então a solução passa por congregar esforços, cerrar fileiras e juntarmo-nos à volta dum projecto que nos motive, que nos arranque deste torpor de país moribundo. Não estamos moribundos.

Vestimos uma pele portuguesa que nos tem bastado durante séculos para resistirmos às maiores violências, às maiores dificuldades. É vulgar distrairmo-nos com a nossa própria dor, que dá voz ao fado, ou distrairmo-nos com o barulho das luzes do lucro fácil, tentando arrepiar caminho, mas nunca recuamos perante adversidade.

 

Venha de lá o projecto nacional, por favor mudem os actores, que estes são autistas políticos, ou então plantem uma ideia ou duas na cabeça do lider.

 

 

Abri um bar. Tenho mais cursos e formação profissional que qualquer golfinho amestrado e não consigo trabalho. "Tem um curriculum demasiado bom"!?!? Demasiado!? Óptimo! Explore-me! apetece responder.

Acredito que nesta altura da crise, só projectos que criem novos negócios podem funcionar. Ninguém vai dar trabalho a ninguém. As coisas vão mudar para muita gente. Os anti-depressivos vão ser o negócio desta próxima década.

Acredito nisto. Quem acreditar comigo, venha beber uma cerveja ao Bar da ANL (remo) na Doca de Santo Amaro.


publicado por BigJoao às 17:08
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Terça-feira, 17 de Janeiro de 2012

... aquilo tinha que acabar!

Há um mês que não os via, um mês que não falava com os filhos.

Ligava todos os dias como se fosse à missa, mas a mãe não passava as chamadas, tirava o telemóvel aos filhos e não os deixava falar.

 

 

 

 

Nesse dia tinha de os ver. Tinha que o fazer. Nada justifica um mês sem os ver, sem lhes falar.

Enviou um sms, avisou que ia sem admitir uma recusa. Atrasou-se... a fulana não se despachava, queria ver isto e aquilo... sonhava acordada sem rumo nem capacidade de decidir se comprava ou não. A angústia tomou conta dele, o volante parecia de espuma... se calhar estava a apertá-lo demais. Entardeceu na estrada. Sabia que não ia chegar a tempo mas havia a possibilidade de ... havia a possibilidade...

 

A rua vazia. Um único prédio novo numa rua... na promessa de uma rua. Qual a probabilidade de acertar no segundo exacto em que o portão da garagem se abria? A frente do carro na abertura da garagem, impedindo o fecho do portão. Incrédulo assistiu aos filhos a correr, a sair do carro e fugir em direcção ao elevador. A fugir de si, do pai.

A partir daí deixou de sentir. Dava passos mas não sentiu os pés no chão. Ignorou a mãe quando passou pelo carro. Deixou de ouvir com clareza. Talvez ela buzinásse. A porta do apartamento à sua frente. Tocou a campaínha com insistência, qual era a pergunta que queria? Qual era a resposta? O que justificava a fuga!?

A porta impassível, sisuda sem compaixão, sem pudor. Chamou, perguntou. A resposta esbarrava sempre na vontade da mãe. O que a mãe queria, o que não queria. Ele queria um beijo, um abraço dos filhos... só isso.

A porta fechada, imóvel, rígida. As mãos no interior sem coragem para a abrir. Sem força para desobedecer.

O alarme a tocar. A mãe lá fora, nem tentou subir. Falava ao telemóvel sem palavras, criando cenários improváveis. Bolsando mentiras. Vómitos de mentiras em GSM. Alta tecnologia a propagar cenários inventados, ao serviço da manipulação.

Finalmente as perguntas tiveram resposta. "Não queriam".

Duas palavras simples, daquelas que se dizem todos os dias. Seja ao Sr. Joaquim da mercearia, ou aos vendedores da Cais em cada sinal de trânsito.

Viu as palavras atravessarem a porta em câmara lenta, cravarem-se em si... no seu corpo. Uma e outra cravaram-se de cada lado da imagem de os ver a fugir de si. Não saiu sangue... nem uma gota. A dor, o absurdo de dor de duas palavras de todos os dias.

Virou costas e desceu... se não queriam era diferente. Completamente diferente.

Passou por alguém. Talvez lhe tenha dito alguma coisa, não ouviu a voz, ou talvez fosse outra pessoa.

Pegou em toda a dor e tentou arrumá-la no carro, mas era um caso perdido. Arrancou com cuidado. Deixou ali algo de si e seguiu.

 

Sem saber como viver, sem dar nome áquela dor, aguentou. O optimismo perdeu-se, a alegria ficou naquele patamar. Nada voltará a ser como dantes.


publicado por BigJoao às 01:27
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Segunda-feira, 6 de Junho de 2011

Participação do cidadão

Em Maio, esta professora brasileira interpelou deputados e a secretária de estado. Talvez fosse importante os deputados prestarem contas aos que os elegem, que mais não fosse para se manterem em contacto com a realidade.

Vale a pena ouvir.

 


publicado por BigJoao às 16:34
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Quinta-feira, 7 de Abril de 2011

Inquietação

A sensação de incómodo não o largou. Quis sair, deitar-se, levantar-se, correr, mas não o suficiente. Deixou-se ficar, depois partiu.

O dia corria quente, ou antes caminhava a passo, num calor indolente.

Uma folha de publicidade esvoaça rente à calçada, empurrada pela brisa suave. O som dos insectos a voar entre arbustos. O ruído dos carros a passar ecoa por entre as esquinas. Só os seus passos o acompanham juntamente com a sombra, que se projeta sempre a esconder-se do sol.

 

A pouco e pouco vamos apagando tudo o que é negativo das lembranças, até já só restarem os tempos áureos. A mágoa espreita, cada vez mais desatenta, transformando-se numa angústia indistinta, até já não se lembrar porque lá está. Quem foi que a esqueceu ali ou por quem existe.

 

Rebobinou as memórias e tentou recriar a sequência, descobrir quando começou o ocaso, o declínio. Pode ter sido aquela vez em que não a sentiu ali, ou terá sido a outra em que o magoou de propósito? Talvez fosse a falta de comunicação nas suas palavras, na sequência de histórias embrulhadas em palavras, ou outra coisa qualquer.

Pensou "És sempre a mesma coisa! Será que esperas alguém perfeito estando tão carregado de defeitos?", mas nunca achamos serem realmente defeitos. Quis ir lá, refrescar os porquês, saber se eram uma circunstância ou um facto, mas não pôde. Não tinha o direito. Seria demasiado egoísta.

 

"O tempo tudo cura", disse. Havia algumas pessoas a quem gostaria de lembrar esta frase... exatamente aquelas que trataram de transformar as mágoas em azedume.

 

Quero que sobre algo de bom, algo perene.

Pode ser que o mar me traga essa paz. Hoje está um bom dia de mar...

ela está bem, é o que importa.

 

O Guincho

 


publicado por BigJoao às 16:24
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